Por Raira Cardoso/Jornalista da Revista Proteção*
Os requisitos de Segurança e Saúde do Trabalho a serem observados em embarcações foram atualizados na NR 30 por meio da Portaria nº 425. A revisão da norma contou com a atuação de um Grupo de Trabalho Tripartite e, de acordo com o coordenador-geral de Segurança e Saúde no Trabalho da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho Marcelo Naegele, o problema regulatório principal identificado foi a exposição dos trabalhadores a bordo de embarcações a perigos decorrentes da falta de uma gestão abrangente dos riscos ocupacionais. “Segundo dados apresentados no relatório da Análise de Impacto Regulatório, entre janeiro de 2016 e julho de 2020, foram registrados 1.637 acidentes no setor aquaviário, dos quais 14 de natureza fatal. Nota-se também que aproximadamente em 6,1% dos acidentes houve afastamento superior a 15 dias, representando eventos com maior gravidade”, aponta o auditor fiscal do Trabalho.
Buscando melhorar esse cenário, uma das novidades destacadas por ele na NR 30 é o novo item que disciplina o Programa de Gerenciamento de Riscos no Trabalho Aquaviário, em harmonia com a NR 1. O empregador ou equiparado deverá elaborar o PGRTA por embarcação, com Inventário de Riscos e Plano de Ação, observando as necessidades e peculiaridades das atividades aquaviárias. O Programa precisará ser revisto a cada três anos ou quando forem identificadas inovações, modificações ou inadequações no ambiente laboral. “Anteriormente, o programa de prevenção de riscos ambientais não levava em consideração os riscos de acidentes ou os riscos ergonômicos. Mas, agora, a organização deverá fazer a gestão de todos os riscos ocupacionais existentes”, compara o integrante da Bancada do Governo na Comissão Tripartite Paritária Permanente.
NOVIDADES
Coordenador da Bancada dos Empregadores pela CNT (Confederação Nacional do Transporte) no GTT, Frederico Toledo Melo afirma que quase 95% das mudanças promovidas na NR 30 foram aprovadas por consenso. “Um dos principais pontos de defasagem era a falta de harmonização da Norma Regulamentadora com os normativos internacionais, que, por vezes, tratavam do mesmo tema sobre um viés diferente, o que dificultava o cumprimento integral de ambas as normas”, cita ele que também integra a CTPP.
Outra questão que precisava ser revista, segundo Melo, era a aplicação da NR 12 a bordo das embarcações. Isso porque, no seu entendimento, tal NR não foi pensada para uma embarcação, cujas máquinas e equipamentos são certificados pela autoridade competente do país de bandeira ou por sociedade classificadora. Ou, ainda, por certificadora por ela reconhecida, desde que atendidos todos os requisitos técnicos de construção relacionados à segurança da máquina ou do equipamento e mantidos de acordo com o projeto da embarcação. “Agora, a forma como está disposto o capítulo de máquinas e equipamentos gera maior segurança aos trabalhadores embarcados, pois prestigia o processo construtivo da embarcação, tendo um olhar ao todo e não apenas para uma máquina ou equipamento isoladamente”, comemora.
Outro dos itens inclusos, foi o 30.17, que trata da capacitação e treinamento em Segurança e Saúde no Trabalho. O treinamento inicial deverá ser presencial, aplicado a todos os tripulantes e com carga horária mínima de quatro horas, abordando tópicos como os riscos inerentes às atividades desenvolvidas e uso adequado de EPCs e EPIs. Já os treinamentos periódicos precisarão ser aplicados a cada dois anos. O tomador de serviços de profissionais não tripulantes deverá exigir do prestador de serviços o certificado de capacitação para o exercício das atividades que irá realizar.
GSSTB
Representante da CUT (Central Única dos Trabalhadores) na Bancada dos Trabalhadores na CTPP, Loricardo de Oliveira ressalta ainda a importância do Grupo de Segurança e Saúde no Trabalho a Bordo das Embarcações para promoção da SST nestes locais. Dentre as novidades, o GSSTB, agora, poderá se reunir por videoconferência na inviabilidade da presença do representante do SESMT a bordo. No entanto, apenas 20% da frota da organização poderá participar da reunião de forma remota. “Esse grupo é formado por trabalhadores marítimos embarcados, juntamente com a CIPA e profissionais de SST. Cabe a ele colocar em prática a implementação das ações de saúde e segurança prevenindo acidentes e adoecimentos”, explica.
Naegele destaca que a revisão também trouxe um tratamento diferenciado para pequenas embarcações. Anteriormente, embarcações com Arqueação Bruta (soma de todos os volumes internos a bordo) a partir de 100 precisavam constituir o GSSTB, sendo que, geralmente, nem possuíam o mínimo de trabalhadores necessários para compor o grupo. Com a revisão, ele será exigido apenas em embarcações com no mínimo 500 AB. Outra mudança diz respeito às embarcações estrangeiras, que somente precisarão constituir GSSTB se forem operar em águas jurisdicionais brasileiras (AJB) por mais de 180 dias.
Oliveira atenta para a exclusão do Anexo 2 da NR 30, que tratava dos trabalhadores em plataforma, permitindo a abordagem do assunto na NR 37 (Plataformas de Petróleo). Outro ponto positivo, ao seu ver, é a exigência de um cozinheiro a bordo e cardápio balanceado nas embarcações onde há o preparo de refeições, em conformidade com as Normam (Normas de Autoridade Marítima) e legislação sanitária aplicável. No entanto, lamenta que o item ‘Conforto’ ficou fora da norma, assim como o termo ‘meio ambiente de trabalho’. “Essa questão limitou o campo de atuação do GSSTB e da CIPA quando forem avaliar o universo de implantação da NR 30”, avalia.
EXPECTATIVAS
Apontando que, na sua experiência, somente as grandes empresas do setor aquaviário cumprem de fato as normas de SST, inclusive por haver maior fiscalização, Oliveira espera que a revisão da norma possa gerar a implementação de ações para uma maior segurança e saúde de todos os trabalhadores de embarcações.
O novo texto passa a valer a partir do dia 3 de janeiro de 2022, mas, quando esta data foi definida, Melo conta que a previsão era que ele fosse publicado em setembro deste ano. “Se as empresas entenderem que o prazo de implementação não é o suficiente, entendo ser possível dialogar com o Governo e Trabalhadores com o objetivo de pensarmos em um prazo que permita o ingresso pacífico do novo normativo, isso já foi feito em outras NRs”, pondera o representante dos empregadores. Ao seu ver, a elaboração e implementação do PGRTA está entre os principais desafios a serem enfrentados nos próximos meses.
Já Naegele acredita que não haverá grandes dificuldades para que as empresas se adéquem ao novo normativo. “As organizações que já vinham se preparando para a implementação do GRO e elaboração do PGR terão agora uma norma específica para auxiliar na implementação desse programa para o trabalho em embarcações em operação”, reitera.
*Texto publicado na matéria especial da edição 359 (novembro) da Revista Proteção.