Fonte: Sinait
Operação realizada por uma equipe de Auditores-Fiscais da Gerência Regional do Trabalho – GRT de Uberaba (MG), no dia 15 de junho, resgatou 34 trabalhadores em condições análogas às de escravos na cidade de Campos Altos (MG), sendo um deles adolescente. Eles foram encontrados em condições degradantes de trabalho em uma propriedade rural, realizando a colheita de café.
“As atividades laborais foram imediatamente interrompidas e foi determinado que o empregador retirasse os trabalhadores migrantes do alojamento e os encaminhasse a um hotel ou pensão”, explica o coordenador da fiscalização, o Auditor-Fiscal do Trabalho Humberto Camasmie.
De acordo com Auditores-Fiscais, a colheita era realizada em cafezais altos e mal cuidados, sem os equipamentos necessários e adequados, como escadas, o que exigia grande esforço dos trabalhadores. Eles tinham que adquirir os materiais de trabalho, como panos e rastelos, além de todos os Equipamentos de Proteção Individual – EPIs.
Não havia banheiros na frente de trabalho, e todos faziam suas necessidades fisiológicas escondidos no cafezal. Uma situação vexatória, sobretudo para as oito mulheres que integravam a equipe de trabalhadores. Além disso, todos estavam expostos ao risco de contato com animais peçonhentos e à ausência de higienização adequada.
Não havia local para que os trabalhadores aquecessem e realizassem suas refeições. Os encarregados da colheita faziam as próprias refeições, a maioria no dia anterior, as mantendo acondicionadas em marmitas. Alguns esquentavam as refeições utilizando artefatos improvisados com álcool ou as ingeriam frias. “Eles improvisavam algum local na lavoura onde pudessem ficar menos expostos ao sol ou a outras intempéries, como ventos, e ali faziam sua refeição, sentados no chão ou em algum objeto que pudesse ser utilizado como assento”, disse Camasmie.

“Nas frentes de trabalho não havia lavatório para higienização das mãos. Durante a inspeção, um escorpião vivo foi encontrado na área em que alguns trabalhadores almoçavam, evidenciando o risco que corriam ao realizar suas refeições sentados no chão, próximos aos pés de café”, contou o Auditor-Fiscal.
O fornecimento de água potável também não era garantido pelo empregador. Cada trabalhador tinha que providenciar seu próprio suprimento diário de água e o recipiente utilizado para acondicionar o líquido. “A água tinha que durar por toda a jornada de trabalho, pois, caso se esgotasse, não tinha reposição”, explicou o coordenador da fiscalização.
Transporte inadequado e a Covid-19
A equipe de fiscalização constatou que os trabalhadores eram transportados em ônibus rural sem respeitar o limite de 50% da capacidade de transporte, regra imposta pelo art. 2º da Resolução nº 2/2020, do Comitê de Prevenção e Enfrentamento ao Coronavírus – Covid-19, da Prefeitura de Campos Altos. Os empregados ainda informaram que não foram fornecidas máscaras respiratórias e álcool em gel, além de ser perceptível a falta de higienização do veículo.
Os trabalhadores não foram instruídos sobre as medidas de proteção necessárias à redução do risco de contaminação do coronavírus, sobre distanciamento social, proibição de compartilhamento de itens pessoais, etiqueta respiratória, uso de EPIs específicos para prevenção de contágio – máscaras ou respiradores –, higiene pessoal e limpeza dos ambientes de trabalho, dentre outras recomendações.
Segundo os Auditores-Fiscais, empregador negligenciou os riscos de contaminação nos diversos ambientes de trabalho, em especial nos alojamentos e transporte de trabalhadores. Nenhuma medida de prevenção foi adotada.
Alojamentos
Oito dos trabalhadores estavam alojados em uma casa fornecida pelo empregador, sem as mínimas condições de habitabilidade.
“Logo de início, chamou atenção a narrativa dos trabalhadores, dizendo que permaneceram por 15 dias no alojamento sem o fornecimento de água, que estava interrompido por falta de pagamento. Informaram que a água utilizada para todos os fins era cedida pelo posto de combustível, localizado de frente ao alojamento. Os trabalhadores esquentavam a água em baldes e tomavam banho de caneca neste período”, contou Humberto.
Na residência não havia armários ou guarda-roupas. Os trabalhadores guardavam seus pertences e suas roupas sobrepostos nos colchões, no chão, ou dependurados nas paredes dos quartos.
Os colchões eram velhos e finos, inadequados para dormir, podendo causar doenças como lordose lombar, cifose torácica e lordose cervical. Quando não estavam no chão, estavam sobre ripas de madeira improvisadas. Roupas de cama e cobertores utilizados pelos trabalhadores estavam bastante deterioradas. Tanto os colchões quanto as roupas de cama foram trazidos pelos próprios trabalhadores.
De acordo com os Auditores-Fiscais “o conjunto de irregularidades demonstra que o empregador rural não atendeu a nenhuma das exigências de segurança e saúde previstas na legislação, patrocinando o desenvolvimento de trabalho que desconsidera aspectos básicos de segurança e saúde e, mais que isso, aspectos básicos de necessidades fisiológicas do ser humano, fato que degrada o trabalho e avilta a dignidade humana”.
Rescisão
A equipe de fiscalização calculou em cerca de R$ 135 mil o valor das verbas salariais e rescisórias devidas aos trabalhadores. Todos os trabalhadores receberam as verbas devidas nesta quinta-feira, 18 de junho, na Agência Regional do Trabalho de Araxá. Eles também receberam guias de Seguro-Desemprego para o Trabalhador Resgatado, fazendo jus a três parcelas do benefício.
Justiça
Uma cópia do relatório circunstanciado da inspeção será encaminhada ao Ministério Público do Trabalho e ao Ministério Público Federal para as providências que entenderem cabíveis no âmbito de suas competências.
O SINAIT observa que os Auditores-Fiscais do Trabalho exercem atividade essencial no enfrentamento à pandemia da Covid-19. Por suas atribuições inerentes ao cargo, são os agentes públicos que garantem o cumprimento das diretrizes estabelecidas para a proteção dos trabalhadores, dos profissionais de saúde e de toda a sociedade nos ambientes de trabalho. Porém, é importante ressaltar que eles também devem estar protegidos no exercício das atividades de fiscalização. Neste sentido, preocupações foram levadas pelo Sindicato e sua Comissão Técnica – Covid-19 /SINAIT à Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, em relação às orientações e medidas que devem ser tomadas para a proteção de todos os Auditores-Fiscais que atuam em fiscalizações diretas, presenciais. De acordo com a Comissão, essa proteção não compreende somente o fornecimento de EPIs. É necessário providenciar o treinamento e a reorganização das sistemáticas de trabalho.