Edição 398 – Fevereiro/2025
Mapeamento, diagnóstico e plano de ação são fundamentais para promover a saúde mental nas empresas
Entrevista à jornalista Marla Cardoso
Em maio próximo, quando as empresas passarão a ser obrigadas a fazer a gestão dos fatores de riscos psicossociais no Programa de Gerenciamento de Riscos, no âmbito da NR 1, um novo desafio irá se impor às organizações que ainda não olham para estes aspectos do trabalho. Primeiro, pela necessidade de compreender o que, de fato, são estes fatores de riscos. Quem chama a atenção é a psicóloga do Trabalho, doutora em Psicologia, consultora em SST e CEO do Nostrum Instituto de Psicologia, de Natal/RN, Alda Silva, que há 15 anos presta serviços de mapeamento desses riscos.
Além do diagnóstico, ela também se dedica à educação corporativa sobre o tema e ao desenvolvimento de planos de ação que vão muito além da prevenção: focam na promoção de ambientes capazes de não adoecer os trabalhadores. Nesta entrevista à Proteção, a especialista reflete sobre o novo momento e explica como as empresas podem se preparar para de fato fazer a gestão dos riscos psicossociais no trabalho.
Quais aspectos do mundo do trabalho são favoráveis para a incidência dos riscos psicossociais?
As pessoas tendem a confundir o risco psicossocial com situações mínimas. Por exemplo, confundem com uma condição estressora de trabalho. A LDRT (Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho) traz uma relação de situações que são preditoras desses riscos. É preciso, por exemplo, olhar o contexto das tarefas do trabalho, se é um trabalho exigente, qual a carga mental, velocidade, complexidade, nível de atenção. Isso tudo se chama conteúdo da tarefa de trabalho. Depois, é preciso olhar a interação pessoa-tarefa. Existe pressão para realização das atividades? O trabalhador tem tempo para executar a tarefa dentro da carga horária de trabalho? Como está a jornada de trabalho? É uma jornada que leva à exaustão? O trabalhador faz pausas? Trabalha por turnos? É preciso olhar para as violências, os assédios morais. As discussões dos riscos psicossociais têm sido muito associadas às questões de assédio. Isso é positivo, mas ao mesmo tempo, não podemos confundir que o risco psicossocial é só o combate às questões de violências ou aos diversos assédios e práticas discriminatórias no cenário organizacional. Temos que considerar que também existem os riscos relacionados à morte no trabalho, traumas que o próprio trabalho pode provocar. Um bancário, um motorista de ônibus, por exemplo, podem ser assaltados. Isso são traumas no trabalho. E temos a própria situação de um trabalho mais instável que leve o trabalhador a contratos mais vulneráveis, que geram o medo do desemprego, além da própria condição de desemprego. Isso também é um fator de risco psicossocial. Não para as organizações, mas para o mundo do trabalho. Se formos pensar na modernidade, temos, por exemplo, o excesso de trabalho como um fator que precisamos dar conta, o direito à desconexão, com as questões de tecnologia. Pós-pandemia passamos por uma grande mudança. Aconteceu uma grande revolução no mundo do trabalho, provocando uma celeridade dos processos. Talvez se a pandemia não tivesse acontecido, levaríamos mais tempo para prestar atenção nessas coisas, mas com a crise sanitária que o Covid produziu, vieram mudanças no próprio cenário social e no mundo do trabalho.
Que mudanças foram essas?
Uma delas é pensarmos sobre o direito à desconexão. Outra é o limite do home office. Muitas empresas ainda não tiveram essas definições sobre esse limite entre o trabalho e a vida pessoal. Muitas entendem que pelo trabalhador estar economizando duas, três horas por dia por não estar no trânsito, ele deve estar à disposição para responder em outros horários também. Isso é um fator de alerta. Outro cenário é o presenteísmo, que é estar no ambiente de trabalho, mas não conseguir produzir. E o próprio absenteísmo, que são as faltas no trabalho, seja por motivos de adoecimento ou porque o trabalhador não sustenta mais estar naquele lugar. Esse cenário da modernidade tem muito a ver com o excesso de jornada e essa dificuldade de se estabelecer o território entre o ambiente privado e o ambiente laboral. Isso é muito comum. Os riscos psicossociais são uma consequência de como eu gerencio todos esses fatores para produzir saúde mental no trabalho. Se temos um contexto de uma boa organização do trabalho, um bom clima de trabalho, isso tudo são fatores de risco psicossocial. Precisamos fazer a leitura do risco psicossocial, não pela causa, mas pela consequência. Essa atualização da NR 1 já era prevista, de certa forma, em outras NRs. A discussão de risco, antes de prevenção, é pensar que o trabalho deve ser promotor de saúde. Para a empresa fazer prevenção ela precisa primeiro promover saúde. Quando vamos discutir risco psicossocial precisamos perguntar: como esse trabalho tem promovido saúde? Quando falamos em risco psicossocial precisamos pensar se esse trabalhador tem conseguido entregar bem o seu trabalho. Quando o trabalhador elencar o porquê para essa resposta, geralmente estão relacionados fatores sobre a estrutura da gestão organizacional, de dificuldade de comunicação; não são questões de individualidade. Muitas empresas quando fazem a avaliação de risco psicossocial e de saúde mental pensam: determinado trabalhador tem um perfil e o outro tem outro, então um sustenta mais coisas que o outro. Não! Riscos psicossociais têm o conceito de condições de trabalho. É uma questão de coletividade.
Confira a entrevista completa na edição de fevereiro da Revista Proteção.