Edição 398 – Fevereiro/2025
Empresas têm a obrigação de oferecer Equipamentos de Proteção Individual confortáveis aos trabalhadores
Reportagem de Marla Cardoso
A legislação é clara. As empresas devem selecionar os EPI (Equipamentos de Proteção Individual) considerando, entre outros aspectos, a adequação do equipamento ao empregado e o conforto oferecido, segundo avaliação do conjunto de empregados. Está determinado no item 6.5.2 da NR 6 (Equipamentos de Proteção Individual). E não só nesta NR. Outras normas também sinalizam que o conforto precisa ser levado em consideração pelas organizações na escolha do EPI.
A tarefa parece não ser tão difícil, afinal, o mercado oferece produtos cada vez mais inovadores que, com a ajuda da tecnologia, são realmente capazes de proteger ao mesmo tempo em que oferecem bem-estar ao trabalhador. A barreira está na velha e conhecida conscientização de muitas empresas, e dos próprios trabalhadores, sobre a importância do uso desses equipamentos.
Outro entrave está no custo desses produtos mais confortáveis. Como são mais tecnológicos, costumam demandar um investimento maior, o que acaba afastando muitos compradores dessa aquisição. Entender que fornecer um EPI com conforto também é oferecer saúde e segurança ao trabalhador talvez seja o primeiro passo para essa necessária mudança de mentalidade em relação aos Equipamentos de Proteção Individual. Os primeiros a ganharem são os próprios trabalhadores. Equipamentos mais confortáveis tendem a ter mais adesão ao uso. Trabalhar com conforto ainda reflete na produtividade, o que também é um ganho para as empresas. Um investimento onde todos ganham!
Imagine trabalhar com um calçado que machuca o seu pé. Com um protetor auditivo tipo concha que aperte na cabeça. Utilizando um óculos de segurança que, constantemente, embace. Ou, então, com uma vestimenta que não permita a mobilidade do corpo. Esses são apenas alguns exemplos do quanto um EPI pode ser desconfortável. O conforto no fornecimento desses equipamentos é tão importante que as próprias normas regulamentadoras determinam que ele seja levado em consideração quando for selecionado pelas empresas.
A NR 6, que trata especificamente sobre os Equipamentos de Proteção Individual, em seu mais recente texto normativo – materializado pela publicação da Portaria MTP nº 2.175, de 28 de julho de 2022 – determina que “é dever da organização selecionar EPI que se adeque ao empregado e que ofereça o conforto necessário à execução do trabalho, segundo avaliação do conjunto de empregados”.
A inclusão dessa obrigação, de acordo com a auditora fiscal do Trabalho e coordenadora-geral de Normatização e Registros – Substituta, Anamélia Taglianetti, corrobora no sentido de não apenas garantir o fornecimento de um EPI tecnicamente adequado, mas que também proporcione conforto ao trabalhador. “Um EPI selecionado corretamente à luz da NR 6, que se adeque e confira conforto, associado a instrumentos de grande importância como o treinamento quanto ao seu uso, bem como a coleta de feedback junto ao usuário, são essenciais para identificar áreas de melhoria e adaptar o EPI às necessidades reais do ambiente de trabalho”, sustenta.

SELEÇÃO
Na prática, essa seleção está amplamente amparada pela NR 6, que compreende uma série de etapas para a escolha correta do EPI. A primeira delas é a análise da atividade exercida na qual o EPI será utilizado. Após essa análise, de acordo com o tecnologista sênior e chefe do Serviço de Laboratório de EPI da Fundacentro, José Damásio de Aquino, devem ser avaliadas as medidas de prevenção a serem implementadas em função dos perigos identificados e dos riscos ocupacionais avaliados. Em seguida, o EPI a ser utilizado deve ser selecionado dentre aqueles previstos no Anexo I da NR 6, que apresenta uma lista de equipamentos de forma genérica.
“Por exemplo, ela estabelece uma série de EPI para proteção dos olhos. São equipamentos genéricos, como óculos para proteção dos olhos contra impactos de partículas volantes. Na etapa seguinte do processo de seleção do EPI, deve ser avaliada a eficácia necessária para o controle da exposição ao risco. Existem dezenas, senão centenas, de modelos de óculos, de fabricantes e importadores diferentes, que oferecem essa proteção. Em função disso, cabe à organização selecionar o modelo específico adequado às suas necessidades”, recomenda.
Após essa seleção, a organização deve verificar se o modelo específico de EPI atende às exigências estabelecidas em normas regulamentadoras e nos demais dispositivos legais. Após essa verificação, a empresa deve adquirir o EPI adequado ao empregado, considerando o conforto oferecido, segundo avaliação conjunta dos empregados. De acordo com Aquino, a última etapa na sequência lógica de seleção de EPI é a verificação da compatibilidade, nos casos que exijam a utilização simultânea de vários EPI.
“Com isso, podemos afirmar que qualquer EPI selecionado em desacordo com as etapas estabelecidas na NR 6 será desconfortável. O aspecto conforto é um dos pontos a ser levado em consideração na seleção de qualquer EPI oferecido aos empregados. Porém, o conforto é apenas um dos aspectos previstos em uma etapa desse processo de seleção. Se qualquer aspecto previsto nas etapas anteriores não for atendido, então a consequência lógica é que o EPI não será confortável, isto é, será desconfortável”, completa.

DESCONFORTO
E o desconforto traz prejuízos ao trabalho. O principal deles é o risco ocupacional ao qual o trabalhador está exposto, indo contra a finalidade do próprio EPI. A engenheira de produção, especialista em Higiene e Segurança do Trabalho, mestra em Design e professora do Departamento de Engenharia de Produção da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), Mayanne Camara Serra, demonstra, por exemplo, que quando há um embaçamento na lente de um óculos de proteção, o usuário tende a retirar esses óculos para limpá-los devido ao desconforto visual, sendo isso suficiente para que haja contato de alguma partícula ou material cortante nos olhos desse trabalhador. Outro caso comum ocorre quando um capacete grande e mal ajustado se move constantemente na cabeça do trabalhador, causando estresse adicional, além do esforço cognitivo que a tarefa exige.
Na situação contrária, um capacete pequeno para a cabeça de uma pessoa pode gerar ferimentos. “Há também os casos de luvas mal ajustadas, que podem restringir os movimentos das mãos em tarefas complexas, e botas de segurança podem exigir maior esforço dos trabalhadores ao andar devido ao seu peso, que pode estar associado a uma biqueira, entre outras situações. Há uma série de cenários para diferentes tipos de EPI desconfortáveis que podem gerar exposição a riscos, estresse e perdas de produtividade. Isso se agrava quando um trabalhador usa simultaneamente diferentes tipos de EPI desconfortáveis”, cita.
Autora de uma dissertação de mestrado sobre Equipamentos de Proteção Individual por trabalhadoras da construção civil de São Luís/MA, Mayanne contou que antes de iniciar sua pesquisa investigou o desconforto dos EPI para trabalhadores em geral, encontrando diversos estudos que destacavam percepções de diferentes setores econômicos com queixas sobre o uso de equipamentos, evidenciando que a questão não era isolada por território, profissão ou tipo de produto. Já no início da pesquisa, por questões de viabilidade, a pesquisadora afirma que precisou delimitar o estudo ao público feminino atuante na construção civil e aos produtos capacetes de segurança, óculos de proteção e botinas de segurança devido à necessidade de maior aprofundamento sobre cada um desses produtos.
PROBLEMÁTICA
Mesmo com essa delimitação, Mayanne identificou que a questão do EPI desconfortável é alarmante para todos os usuários. Porém, a problemática se eleva para as mulheres devido aos produtos de proteção terem sido historicamente projetados para o público masculino e ao fato de as mulheres apresentarem a maioria das dimensões antropométricas menores que as de homens. “Os aspectos antropométricos não estão sendo efetivamente considerados no projeto de EPI para ambos os gêneros, pois até mesmo algumas normas técnicas sobre esses produtos não trazem muitos detalhamentos sobre as dimensões que devem ser adotadas. Como agravante, é ausente um levantamento antropométrico sistematizado e atualizado sobre as medidas corporais dos brasileiros e brasileiras, e muitos produtos ainda são disponibilizados em “tamanho único” ou com poucas possibilidades de ajustes”, compartilhou, enfatizando que essa problemática não se restringe ao âmbito nacional, pois também é abordada por pesquisas de países de diferentes continentes.

Durante sua pesquisa, a docente conta que recebeu relatos, por exemplo, sobre capacetes grandes e pesados que não se encaixavam confortavelmente em cabeças femininas. “Sobre o capacete, houve relatos de que eles aumentavam a sensação de calor durante o uso, algo ratificado na literatura em pesquisas que abrangiam usuários do gênero masculino. As participantes do estudo também descreveram estratégias para contornar as dificuldades quanto ao uso de EPIs. Por exemplo, houve trabalhadoras informando que prendiam o cabelo por cima de hastes de óculos de proteção para impedir que esses caíssem de suas faces, pois eram grandes para elas”, afirmou.
Outras estratégias adotadas pelas trabalhadoras envolviam o uso de duas meias para maior comodidade dos pés em botas de segurança. Diante dessas informações, Mayanne entende que caso houvesse uma base de dados antropométrica ampla e atualizada, poderiam ser geradas normas técnicas mais completas e assertivas sobre os EPI. “Assim, a questão do desconforto seria bastante reduzida com o projeto e fabricação de produtos mais variados e mais adequados às diferentes medidas corporais. Após solucionar a questão dimensional, poderiam ser aprofundados outros aspectos como tipos de materiais, estética e formatos dos produtos. Para isso, faz-se necessária uma abordagem interdisciplinar entre engenharia, design, Segurança do Trabalho, gestão, entre outras áreas”, sugere.
CONSEQUÊNCIAS
O diretor e pesquisador científico do Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico, órgão da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Hamilton Humberto Ramos, lembra que um EPI sem conforto pode ocasionar diferentes problemas à saúde e à segurança dos trabalhadores. Como exemplo, podem causar distração, diminuindo a capacidade de concentração do trabalhador, afetando sua performance e podendo levar a erros que aumentam o risco de acidentes.
“EPI com conforto térmico inadequado, por exemplo, pode levar a problemas de saúde como a exaustão pelo calor/estresse, podendo afastar o trabalhador da atividade. Ainda, pode levar à negligência no uso ou mesmo à remoção por parte do trabalhador, comprometendo a segurança. Na agricultura, a utilização de EPI adaptado da indústria e não adequado ao meio rural por muitos anos é provavelmente o principal fator para a rejeição ao uso por parte do trabalhador que ainda se observa hoje”, acredita Ramos.
Outro prejuízo à saúde e segurança dos trabalhadores, de acordo com Aquino, é a possível exposição aos agentes agressivos presentes nos ambientes de trabalho. “Se o EPI é desconfortável, a tendência é o trabalhador evitar o seu uso ou tentar fazer ajustes indevidos para melhorar a sensação de conforto. Essa situação faz com que o EPI não seja usado durante todo o período de exposição ao agente agressivo, ou seja, é usado de forma incorreta. Isso pode causar uma falsa sensação de proteção”, completa.
Inovação é aliada
Mercado oferta diversas soluções que prometem conforto aos trabalhadores

Desenvolvedores e fabricantes de Equipamentos de Proteção Individual já entenderam que o conforto vai muito além de uma exigência legal e aproveitam a inovação em materiais e tecnologias para criar EPI que realmente ofereça mais conforto aos trabalhadores. Essa visão, na opinião da gerente de Marketing de Produto da MSA, Fernanda Hyodo, sempre foi um aspecto fundamental no design e desenvolvimento de Equipamentos de Proteção Individual. “O conforto não é apenas uma questão de bem-estar. Ele tem um impacto direto na performance e na saúde do trabalhador, além de reduzir os custos com ausências por motivos de saúde e melhorar a satisfação e a produtividade no ambiente de trabalho”, entende.
Por isso, Fernanda afirma que a MSA tem investido em soluções tecnológicas avançadas pensando no conforto e garantindo que os produtos atendam às necessidades dos trabalhadores em diversos ambientes. Um exemplo é a tecnologia de barreira térmica ReflectIR, aplicada no capacete V-Gard C1. A gerente afirma que este capacete é projetado para refletir a luz solar, proporcionando uma redução de até 11°C na sensação térmica do usuário. “Esse efeito é particularmente importante em locais expostos ao sol intenso, como atividades de manutenção de equipamentos e instalações agrícolas ao ar livre, minas a céu aberto e plataformas offshore, onde o estresse térmico pode comprometer a saúde e o desempenho dos trabalhadores”, detalhou.
A barreira térmica age contra a radiação solar, ajudando a manter o usuário mais fresco e confortável, o que diminui a incidência de problemas de saúde relacionados ao calor, como desidratação, tonturas e quedas de pressão arterial. “Além disso, esse conforto térmico contribui para melhorar a concentração e o foco do trabalhador, impactando positivamente sua produtividade”, destacou. Além dessa tecnologia, a MSA também utiliza materiais com propriedades avançadas de absorção de suor e respirabilidade, que garantem uma redução do desconforto causado pela exposição prolongada ao sol.
“Essas tecnologias não só promovem o conforto imediato, mas também oferecem benefícios a longo prazo, como a redução da fadiga e a melhoria da Saúde Ocupacional dos trabalhadores, o que reflete diretamente na eficiência e segurança no ambiente de trabalho”, completou Fernanda.

TECNOLOGIAS
Quando a proteção é para o trabalho em altura, a Honeywell cita o exemplo de uma recém-lançada linha de cintos que possui proteção lombar, com acolchoamento respirável para alívio à pressão do equipamento sobre o corpo. O especialista em proteção contra quedas da empresa, Rafael Cruz, explica que os cintos foram projetados de forma anatômica e ergonômica para oferecer maior conforto e liberdade de movimento. “Os trabalhadores são mantidos mais secos com a nova almofada de cintura respirável, tornando o cinto ainda mais leve.
nquanto outros cintos podem proteger os trabalhadores de ferimentos graves às custas de seu bem-estar a longo prazo, essa linha visa além da conformidade, manter os trabalhadores seguros e apoiados – facilitando seu trabalho e deixando-os mais confortáveis”, explicou.
Também representando o mercado de EPI para trabalho em altura, o gerente de Território da Ultra Safe, Fernando Campos, explicou que equipamentos que possuem acolchoamento nos pontos de contato com a região lombar e posterior às coxas do colaborador proporcionam maior conforto.
“Contamos nos cintos com um sistema de espuma de densidade progressiva com maior sustentação e respirabilidade, evitando o acúmulo de umidade. Outra tecnologia de ponta são os tecidos com trama, fabricados em fibra sintética de alta resistência à tração e atrito, que proporcionam um toque macio. Ainda temos os sistemas de costuras circulares, que promovem uma distribuição uniforme de resistência à tração, seja qual for sua direção”, afirma. Campos ainda diz que a Ultra Safe investe em cintos com fitas com filamentos de alta tenacidade, mais resistentes em relação aos filamentos convencionais.
A inovação também está presente nos calçados. A Marluvas tem um catálogo extenso de calçados de segurança que utiliza tecnologias nos forros, cabedais e processos de dublagem, que contribuem para o controle da temperatura interna dos calçados. As tecnologias empregadas nos solados colaboram para a estabilidade e absorção do impacto durante os movimentos na jornada de trabalho e, nas palmilhas, contribuem com a distribuição equilibrada das cargas na região inferior dos pés.
“Testamos e validamos os produtos conforme normas técnicas de avaliação de conforto (ABNT NBR 14834 até a 14840). Estes ensaios normativos avaliam e comprovam o conforto através da massa do calçado, temperatura, distribuição de pressão plantar, absorção do impacto, ângulo de pronação (estabilidade) e percepção do calce”, explicou a coordenadora de Desenvolvimento de Novos Produtos, Daniele Rezende Belchior.

PROTEÇÃO RESPIRATÓRIA
A tecnologia também colabora para o conforto dos equipamentos de proteção respiratória. A Dräger afirma que investe em pesquisa e desenvolvimento de materiais mais leves, flexíveis e respiráveis. O design ergonômico também é outro ponto fundamental para a marca, com ajustes personalizados para melhorar a adaptação ao usuário e reduzir desconfortos, como peso excessivo. “Realizamos testes com usuários reais para ajustar os produtos com base em feedback, garantindo maior conforto sem comprometer os níveis de proteção. O objetivo é criar EPIs que ofereçam segurança eficaz e sejam confortáveis para o uso prolongado, incentivando o uso contínuo”, explicou o coordenador de Produtos, Joelmir Morais.
O gestor afirma que a Dräger utiliza a nanotecnologia do grafeno na construção de cilindros de máscaras autônomas, que permite a redução em torno de 30% do peso em relação ao equipamento anterior. “Também temos uma peça semifacial filtrante que possui uma manta com filtragem superior à exigida nas normas vigentes e com alta respirabilidade, isto devido ao tratamento eletrostático que desenvolvemos ao produto”, explicou.
Desenvolvendo máscaras e filtros para proteção respiratória, a GVS do Brasil também aposta em materiais termoplásticos leves e flexíveis para garantir o conforto. O gerente Nacional de Vendas GVS do Brasil, Eduardo Mikowski, afirma que as máscaras são fabricadas com termoplásticos que proporcionam um ajuste anatômico e leveza, garantindo vedação eficaz sem causar pressão excessiva, mesmo em usos prolongados. Nos filtros, a GVS aposta na alta eficiência com baixa resistência respiratória. É que os produtos capturam até as menores partículas sem comprometer o fluxo de ar, reduzindo o esforço respiratório e promovendo uma experiência mais natural e menos cansativa para o trabalhador. Outro diferencial da marca é a selagem de silicone no respirador facial inteiro. O EPI conta com bordas de silicone, produzido com os mesmos materiais desenvolvidos para equipamentos de uso hospitalar, que previnem irritações na pele e garantem um encaixe mais preciso e cômodo.
“Outra linha de respiradores possui arneses acolchoados com sistemas de ajuste intuitivos. Distribuem o peso uniformemente e eliminam pontos de pressão, adaptando-se a diferentes biotipos. Também possuímos uma proteção integrada contra ruído e vibração. O respirador é equipado com espuma acústica e tecnologia antivibração, que minimiza o desconforto causado por exposição a sons intensos e vibrações prolongadas”, detalhou Mikowski.
O gerente também indicou que outra linha de respiradores inclui visores amplos e antirreflexo, melhoram a visibilidade sem sacrificar o ajuste, reduzindo o esforço ocular. “A integração dessas tecnologias, não apenas melhora o desempenho técnico dos EPI, mas também aumenta significativamente o conforto do usuário. Isso se reflete em maior adesão ao uso, prevenção de lesões secundárias e maior produtividade. Ao equilibrar proteção e bem-estar, conseguimos garantir que os produtos atendam não apenas às normas de segurança, mas também às expectativas dos trabalhadores modernos”, completou.
Head comercial de uma marca de EPI, Arnaldo Ribeiro da Cruz também lembra que a integração de dispositivos tecnológicos (IoT) nos equipamentos de proteção já é uma realidade disponível em equipamentos de proteção das principais marcas internacionais, e que isto representa um avanço significativo na proteção e produtividade. “Aliado com a ergonomia, esses dispositivos promovem um maior conforto aos usuários. Com a utilização destes elementos tecnológicos será possível monitorar em tempo real a saúde e o ambiente do trabalhador”, detalha. Como exemplo, Cruz sinaliza que equipamentos como luvas, coletes e capacetes poderão contribuir no monitoramento dos níveis de stress, fadiga, variação de temperatura corporal, variação da frequência cardíaca e pressão arterial, além de controlar o grau de exposição a gases perigosos.
IBTeC avalia o conforto dos calçados
Há mais de 50 anos, o IBTeC (Instituto Brasileire Tecnologia do Couro, Calçado e Artefatos), com sede em Novo Hamburgo/RS, atua ofertando soluções de serviços técnico-científicos para a indústria coureiro-calçadista, de componentes, EPIs e têxtil. O Instituto atende aos quesitos de normas técnicas, de qualidade e performance em produtos e materiais, realizando avaliação com ensaios na área de biomecânica, físico-mecânicos, de microbiologia e análise de substâncias restritas. O conforto em calçados de segurança é uma das frentes avaliadas.
De acordo com o presidente executivo do IBTeC, Valdir Soldi, hoje diversas empresas desenvolvem todos seus produtos de segurança nos laboratórios do Instituto, com apoio das equipes técnicas tanto no que diz respeito a conforto, através do trabalho dos laboratórios de biomecânica, quanto no que diz respeito à qualidade, avaliada no laboratório físico mecânico. “Neste tipo de trabalho, as equipes do IBTeC fazem uma interação direta com os designers e desenvolvedores das indústrias, testando cada componente tanto em qualidade e resistência para o fim específico a que o calçado se destina, quanto em conforto, através de testes de biomecânica feitos em laboratório. O instituto auxilia as indústrias também na busca de novos materiais, que contribuam para o desenvolvimento de produtos mais confortáveis”, destacou.

Soldi explica que há sete normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) para medir o conforto de um calçado e para verificar este quesito, há equipamentos modernos, com capacidade para fazer medições de forma precisa e baseada em definições científicas. “As indústrias podem submeter a avaliação tanto do calçado pronto quanto de materiais que queiram utilizar para a produção de seus modelos. Nos dois casos, os técnicos do IBTeC oferecem, não apenas o laudo com as informações técnicas, mas também uma orientação sobre como substituir materiais e tecnologias que não tenham alcançado aprovação nos ensaios de laboratório”, explicou.
As avaliações são feitas em ensaios realizados com a participação de modelos humanos, treinados para fazer as avaliações práticas. Para avaliação do conforto, são avaliados aspectos como peso do calçado, sua capacidade de troca de calor com o exterior, distribuição de carga plantar, amortecimento proporcionado pelo solado e pela palmilha, além da estabilidade na marcha e calce.
O melhor custo-benefício
Decisão de compra deve ir muito além do preço do EPI
Tecnologias inovadoras, como as que focam no conforto, frequentemente exigem um investimento inicial diferenciado por parte dos compradores. Isso se deve a aspectos como a utilização de materiais de alta qualidade e a pesquisa em design ergonômico. Acontece que, por terem um custo mais elevado, podem afastar o comprador.

Nos estudos que desenvolve sobre a percepção de conforto dos trabalhadores em relação aos EPI, a engenheira de produção, especialista em Higiene e Segurança do Trabalho, mestra em Design e professora do Departamento de Engenharia de Produção da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), Mayanne Camara Serra, afirma que em entrevistas que realizou, houve bastante menção à questão do custo mais elevado para os EPI considerados de maior qualidade e menor desconforto. “Em relatos de trabalhadoras para a pesquisa, foi informado que, mesmo recebendo os EPI de empregadores, muitas delas preferiam comprar outro modelo mais confortável com recursos próprios. Isso evidencia uma tendência do fornecimento de produtos de proteção mais baratos em detrimento do aspecto conforto”, sinaliza.
No mercado, Mayanne cita, por exemplo, que é possível encontrar um capacete de segurança simples, de baixo custo e baixa durabilidade e, junto com ele, há também modelos de capacete de segurança com o valor quatro vezes maior, mas que são mais completos, resistentes e mais duráveis. “Diante dessas opções, percebo que o modelo mais simples tende a ser o mais escolhido devido à necessidade de fornecimento em grande quantidade para trabalhadores de postos mais operacionais. Esses modelos mais simples são os mais questionáveis quanto ao conforto, mas os modelos mais caros também receberam críticas durante o uso por mulheres, conforme relatos da minha pesquisa”, apontou a docente.

ANÁLISE
Ao compararmos equipamentos de proteção comuns com aqueles que trazem tecnologias, tanto de materiais como de dispositivos tecnológicos, o head comercial da área de EPI, Arnaldo Ribeiro Cruz, afirma que a primeira impressão é que o investimento será maior. Entretanto, é preciso ser considerado na análise de compra uma visão mais ampla, abrangendo outros aspectos além do custo. “Entre eles está a frequência de substituição, o custo do descarte, o nível de proteção, o conforto para o trabalhador e a produtividade. Ao levarmos todos estes aspectos em consideração, seremos surpreendidos positivamente com valores iguais e até mesmo menores, o que pode representar oportunidades de economias nos valores investidos”, alertou.

A mesma opinião é compartilhada pela gerente de Marketing de Produto da MSA, Fernanda Hyodo que lembra que, ao analisarmos esse custo “maior” sob uma perspectiva mais ampla, é possível perceber os benefícios tangíveis que essas tecnologias podem oferecer a longo prazo. “O conforto no uso do EPI pode resultar em um aumento significativo na produtividade, maior satisfação dos trabalhadores e, em muitos casos, até mesmo na prevenção de acidentes, especialmente em situações de estresse térmico, como no caso de trabalhadores expostos ao calor. Sintomas relacionados ao calor, como tonturas e desmaios, além de comprometer a saúde do trabalhador, também podem representar um risco para o ambiente de trabalho como um todo, dependendo da natureza das operações que ele realiza”, alerta.
No Brasil, Fernanda diz que já é possível observar que as grandes empresas, cada vez mais, reconhecem o valor de investir em produtos que ofereçam maior conforto para seus trabalhadores. “Existe um entendimento crescente de que o conforto não é apenas uma questão de bem-estar, mas um fator diretamente relacionado à produtividade e, principalmente, à segurança no ambiente de trabalho. Na MSA, temos notado um aumento significativo na demanda por EPI com tecnologias avançadas que oferecem maior conforto. As empresas que adotam esses produtos geralmente observam uma melhoria no engajamento dos trabalhadores e uma redução nos custos relacionados à Saúde Ocupacional”, garante.

Outra vantagem, de acordo com o especialista em Equipamentos de Proteção Brasil da Honeywell, Rafael Cruz, é que já foi comprovado que esses produtos tendem a ter uma vida útil maior em comparação com o item de baixo custo. “Temos diversos relatos como esse dentro da empresa, com o exemplo de clientes que usavam óculos de proteção mais simples que trocavam a cada 15 dias, para outro que custa três vezes mais, mas que tem uma vida útil de mais de 12 meses”, exemplifica.
NORMAS TÉCNICAS
Mesmo diante desses e de outros argumentos, optar por equipamentos de proteção mais simples em detrimento dos mais tecnológicos e confortáveis pode estar relacionado com outros fatores muito anteriores à compra. Um deles, na visão do diretor e pesquisador científico do Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico, órgão da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Hamilton Humberto Ramos, pode ser atribuído ao baixo desenvolvimento de normas técnicas estabelecendo padrões de qualidade e segurança para os diferentes EPI, considerado por ele um ponto de inflexão na qualidade dos Equipamentos de Proteção Individual. Hoje, de acordo com o superintendente do Comitê Brasileiro de Equipamentos de Proteção Individual – ABNT/CB-032, Raul Casanova Junior, existem apenas normas técnicas voltadas para o conforto dos calçados, que incluem os de segurança. “Há previsão de levar o tema do conforto para o CB 32”, afirmou.

Para Ramos, quando não se tem parâmetros de qualidade, o que manda é apenas o custo, e isso normalmente leva a produtos de qualidade inferior. “Quando as normas existem e são adotadas, elas devem ser cumpridas, e o custo passa a ser importante apenas para os EPI com a qualidade necessária para certificação”, opina. No caso de vestimentas para riscos químicos, por exemplo, Ramos diz que para que elas sejam aprovadas, entre outras exigências, existe a necessidade da realização de uma série de exercícios práticos para garantir que a modelagem não impeça o movimento ou mesmo danifique a vestimenta durante o uso, além de um teste de pulverização diretamente sobre a vestimenta, de uma calda com corante alimentício, para garantir que não haja pontos de penetração da pulverização. “Isso tem levado a uma evolução grande na modelagem dos EPI, o que tem reduzido o desconforto. Para o fabricante de EPI, o estabelecimento de padrões de qualidade também é importante, pois serve como base de orientação ao desenvolvimento de novas tecnologias”, lembra.
Mayanne também sugere outro aspecto. Para ela, é provável que o maior enfoque sobre o custo também tenha relação com a baixa conscientização a respeito do retorno de investimento com EPI mais confortáveis, que possuem preços mais elevados no mercado. Para mudar isso, na opinião da especialista, é importante uma maior disseminação sobre a relevância dos investimentos em Segurança do Trabalho. “Como em muitas situações, não dispomos de uma alternativa viável para eliminar um risco ocupacional, o uso do EPI é necessário, por isso é imprescindível que esses equipamentos sejam constantemente aprimorados”, indica.
ESTRATÉGIAS
Caso haja resistência quanto aos custos para aquisição de modelos mais confortáveis, a engenheira sugere que as empresas elaborem uma análise minuciosa sobre os ganhos de produtividade, redução de acidentes e de gastos relacionados aos EPI. “Dessa forma, conseguirão verificar que é bastante válido o investimento em ações voltadas para aumentar a Segurança Ocupacional”, justifica. Mayanne também sugere que seja realizado um levantamento junto aos trabalhadores que fazem parte da empresa em relação a alguns aspectos como idade, estatura, gênero, se possuem alguma deficiência e outras particularidades. Esse levantamento pode subsidiar a aquisição de EPIs mais adequados a esses trabalhadores. “Por exemplo, caso seja necessário que os trabalhadores usem uma vestimenta de proteção de corpo inteiro, deve-se garantir vestimentas de variadas dimensões e possibilidades de ajustes confortáveis para a diversidade de pessoas da empresa”, contextualiza.

Paralelamente, é imprescindível uma mudança interna nas empresas e também por parte dos profissionais de SST para fortalecer a conscientização entre os trabalhadores acerca da importância do uso do EPI. Para isso, os gestores têm um papel essencial no sentido de evitar a perpetuação de preconceitos sobre o uso do equipamento de proteção ser sempre algo inconveniente, mas que precisa ser usado apenas porque é obrigatório. “Isso é necessário porque de nada adiantará fornecer um EPI mais confortável se o trabalhador não usar adequadamente esse produto”, indica a engenheira.
Outra estratégia complementar é abrir a empresa para pesquisas de instituições de ensino que têm os EPI em seus objetos de estudo. Dessa forma, pode-se potencializar as melhorias quanto ao uso do equipamento de proteção na perspectiva da gestão, do projeto e da sua produção.
A legislação é bastante clara indicando que a responsabilidade das empresas vai além do fornecimento do Equipamento de Proteção Individual. É preciso investir em proteções que ofereçam conforto e sejam adequadas à realidade do trabalho e às particularidades do trabalhador. Quanto a isso não dá dúvidas. Também não se questiona se o mercado oferece soluções tecnológicas capazes de oferecer muito conforto. Isso já é uma realidade. É preciso, então, avançar no entendimento das empresas, que disponibilizam os EPI aos trabalhadores, sobre o impacto do conforto oferecido por estes produtos aos seus profissionais.