Especialista e instrutor de resgate em espaço confinado fala dos acidentes na agroindústria e do despreparo do profissionais
Entrevista à jornalista Marla Cardoso
As recorrentes notícias comprovam: acidentes envolvendo o trabalho no armazenamento de grãos e cereais – em especial nos silos – têm sido cada vez mais frequentes e letais. Em sua maioria, ocorrências envolvendo engolfamento e soterramento dos trabalhadores nos grãos, quedas de altura ou outros riscos presentes nos espaços confinados do setor. Infelizmente, as estatísticas oficiais não conseguem dar conta de revelar a realidade acidentária na área dada a complexidade que movimenta a operação destes negócios, muitos localizados em áreas longínquas em regiões no interior do país.
É justamente esta engrenagem que tem chamado a atenção do tecnólogo de Segurança do Trabalho, instrutor do Corpo de Bombeiros Militar em resgate em espaço confinado e autor do Manual Técnico de Resgate em Espaço Confinado, Sérgio Luís Chagas. Com três décadas de experiência no atendimento a ocorrências dessa natureza como bombeiro militar em Minas Gerais, ele hoje se considera um pesquisador entusiasmado pelos riscos que envolvem o trabalho nessas estruturas.
Nesta entrevista, o bombeiro militar aposentado, instrutor, consultor e coordenador de equipes de resgate industrial, reflete sobre a Segurança do Trabalho em armazéns de grãos e cereais, trata sobre o resgate nesses espaços e como evitar que o setor siga causando a morte de tantos trabalhadores.
Qual a sua atuação na área de Segurança do Trabalho e experiência com armazéns de grãos e cereais?
Sou tecnólogo em Segurança do Trabalho, com pós-graduações na área e atualmente estou no quadro de reserva do CBMMG (Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais). Sou consultor, escritor, instrutor de treinamentos de emergência e coordenador de equipes de resgate industrial em altura e espaço confinado. Apesar de estar envolvido com diversos setores industriais, tenho procurado dar um foco especial na agroindústria, devido a sua complexidade e também por ser um dos lugares onde mais ocorrem acidentes em espaços confinados. Me considero um pesquisador entusiasmado por esse segmento. A minha experiência nessa área vem de treinamentos e intercâmbios realizados, não só no Brasil, mas também em outros países como Paraguai, México e Estados Unidos, além de toda vivência e conhecimento adquiridos no Corpo de Bombeiros Militar, através do atendimento a ocorrências reais ao longo de 30 anos.
Conforme levantamento realizado pela Fiscalização do Trabalho, entre 2020 e 2023 foram registrados 223 acidentes em armazéns de grãos e cereais no país, com 236 vítimas fatais. O que faz com que este setor registre tantos acidentes de trabalho?
Particularmente, acho que tanto o número de acidentes quanto o de vítimas ocorridos nesse período, é bem maior. Principalmente porque muitos desses acidentes ocorrem em zonas rurais e muitas vezes não são divulgados ou até mesmo notificados. Há uma frase muito antiga de um autor desconhecido que diz o seguinte: “O acidente ocorre onde falha a prevenção”. Para mim, isso resume tudo. Enquanto não houver uma gestão de segurança realmente séria, enquanto as organizações não se comprometerem de verdade, os acidentes continuarão acontecendo. Isso vale para as empresas de pequeno, médio e grande porte. Enquanto elas não voltarem a sua atenção para aquele trabalhador que está vulnerável, arriscando a sua vida todos os dias, as tragédias não irão cessar. Esse ano mesmo já ocorreram dezenas de acidentes em silos. Às vezes, até mais de um acidente em uma semana. Sabemos que o agronegócio é um dos setores mais importantes para a nossa economia, mas também onde ocorre boa parte dos acidentes em espaços confinados. Para modificar essa realidade, o Ministério Público do Trabalho poderia fomentar a necessidade de fiscalização contínua na agroindústria e a criação de normas técnicas específicas para esses locais.
Confira a entrevista completa na edição de julho da Revista Proteção.