– Professor, estava lendo sobre o eSocial e no artigo falavam maravilhas sobre esse sistema, mas para ser sincero não fiquei convencido, não acredito nessa mudança radical que estão esperando. Na minha opinião as empresas que não estão nem aí com a Segurança do Trabalho não irão mudar. Qual a sua opinião?
– Meu filho, concordo em parte com você, mas sou um pouco menos pessimista. Acredito que o eSocial irá ajudar no aumento da percepção do perigo dos empresários em relação a possibilidade de serem penalizados, mas não das atividades perigosas das empresas.
– Não entendi bem, professor. Pode explicar melhor?
– Claro! Para auxiliar na explicação vou utilizar o modelo da teoria de compensação do risco desenvolvido por John Adams. Abaixo o modelo:

– Vamos para um exemplo geral para facilitar o entendimento e depois insiro a ideia do eSocial: imagine que é sexta-feira, fim de expediente e você precisa acabar determinada tarefa em altura. Você trabalha há dez anos neste tipo de serviço e não acha que seja um trabalho arriscado. Ou seja, não é tão difícil de acreditar que você tem um estímulo a correr risco em função da recompensa de sair logo do trabalho. Além disso, como sua percepção do perigo é considerá-lo aceitável, pois trabalha faz tempo nessa área e nunca sofreu um acidente grave, seu comportamento de equilíbrio lhe permite a ficar mais exposto, o que pode gerar um acidente. Não sei se deu para entender a ideia, mas o modelo indica que se você não acredita na possibilidade do acidente e se tem algum tipo de recompensa é provável que aumente a propensão a correr riscos.
– Entendi a ideia, mas não entendi a relação com o eSocial.
– Perfeito, meu filho. Pelo menos já caminhamos alguns passos. Vamos então focar na sua dúvida, mas antes tenho uma pergunta: hoje como o empresário pode ser penalizado por deixar o trabalhador fora das condições adequadas de Saúde e Segurança do Trabalho?
– Professor, irá depender da fiscalização.
– Ok, mas é algo frequente?
– Aqui na empresa o comum é passarem no máximo, duas vezes por ano, mas isso ocorre porque trabalho em uma empresa enorme. Em empresas menores que eu já trabalhei, as visitas eram anuais ou mesmo não chegavam a ocorrer.
– Mais uma pergunta: com quem fica a documentação de Segurança do Trabalho das empresas?
– Com a própria empresa, professor.
– Ou seja, para o atual sistema em que as empresas estão inseridas o empresário que não segue todos os critérios legais, tem como recompensa, pelo menos no entendimento dele, a economia por não ter gastar com a SST. Além disso, não há frequência de fiscalização e como os acidentes não são bem analisados, acaba-se acreditando que não têm impacto elevado nas finanças da organização, então podemos afirmar que há baixa percepção do perigo. Como consequência o empresário tem todo o estímulo para aumentar a sua propensão a correr riscos.
– Mas o que mudará com o eSocial?
– Primeiro ponto, o documento que fica na empresa será enviado para o governo, ao ser enviado é possível fazer uma triagem automática. Por exemplo, devido ao banco de dados o fiscal terá facilidade de entender que para determinada atividade econômica o produto químico X é um perigo frequente e caso sua empresa esteja nessa atividade econômica e não indique o tal produto aumenta a possibilidade de ser acionado pela fiscalização.
– Com o eSocial o empresário poderá ter o aumento da percepção do perigo de ser multado, nesse caso a recompensa de não investir em Segurança do Trabalho e consequentemente a propensão a correr esse risco tende a baixar. Lógico que isso só irá ocorrer se o governo demonstrar que tem condições de agir.
– Mas o senhor acredita que com cada vez menos recursos e fiscais o eSocial pode gerar esse medo?
– Meu filho, essa é a pergunta que não tenho como responder. Claro que não acredito em um sistema funcionando 100%, mas caso ele funcione pelo menos uns 50% já será o suficiente para colocar uma pulga atrás da orelha dos empresários e fazer com que a Segurança do Trabalho avance. O que nos resta é continuar trabalhando, mas também divulgar as informações, torcer e aguardar.

O blog Segurito na Proteção trata de questões relacionadas à SST. É editado pelo professor Mário Sobral Jr, que é Mestre, engenheiro de Segurança do Trabalho, especialização em Higiene Ocupacional e Ergonomia e Editor do Jornal Segurito.
mariosobral@jornalsegurito.com