quinta-feira, 19 de junho de 2025

Procurador do Trabalho detalha ação do MPT sobre revisão das NRs

Por Martina Wartchow/Jornalista da Revista Proteção

O procurador do Trabalho Luciano Leivas, vice-coordenador da Codemat (Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho) e participante da CTPP (Comissão Tripartite Paritária Permanente) como observador, se manifestou a respeito da ACP (Ação Civil Pública) movida pelo Ministério Público do Trabalho contra a União a respeito do processo de revisão das Normas Regulamentadoras de Segurança e Saúde do Trabalho. A reportagem da revista Proteção entrou em contato com ele para que detalhasse o que, na visão do MPT, não está sendo cumprido.

Em suas respostas, Leivas aborda os requisitos procedimentais previstos nos artigos 2º, incisos II e III, 4º, § 1º e § 2º, 7º e 9º, da Portaria MTB nº 1.224, de 28 de dezembro de 2018, que estabelece procedimentos para a elaboração e revisão de NRs. Conforme liminar parcial concedida no dia 22 de abril pela Justiça do Trabalho, tais ditames devem ser cumpridos imediatamente e eventual descumprimento a partir do dia útil subsequente à data de concessão da liminar resultará na imposição da pena de multa de R$ 500 mil por NR editada, revogada, revisada ou alterada em desacordo. Confira abaixo.

Proteção – Os incisos II e III do artigo 2º da Portaria nº 1.224/2018 determinam a elaboração de um texto técnico básico e sua disponibilização para consulta pública. Isso não está sendo feito na avaliação do MPT?

Leivas – Não. O texto técnico básico aludido no inciso III do artigo 2º não foi disponibilizado em nenhuma das consultas públicas efetuadas em 2019, notadamente no caso das NRs 4, 5, 7, 9, 15, 17, 18, 29, 31 e 32. O que está sendo objeto da consulta pública é a – já pronta e elaborada – proposta de texto para revisão. Texto técnico básico é o texto que vai subsidiar a proposta de texto para revisão. São fase diversas. Na prática, uma contribuição pública tende a ser mais incorporada na fase inicial (texto básico) do que na fase da proposta de texto.

Proteção – O artigo 4º diz que a propostade revisão ou criação de NRs deve conter análise de impacto regulatório de acordo com os itens mencionados nos parágrafos 1º e 2º. Entre eles, menciona, por exemplo, que a análise deve conter indicadores, tais como taxas de acidentes ou doenças, trabalhadores atingidos dados da fiscalização. Essa análise preliminar não está sendo apresentada? E quanto ao plano de trabalho?

Leivas – A Análise de Impacto Regulatório também não vem sendo observada no processo de revisão das normas regulamentadoras. Embora a AIR seja exigida pela Portaria nº 1224/2018 e pela Lei de Liberdade Econômica, tal análise não foi realizada em nenhuma das NRs revisadas e/ou alteradas em 2019 e 2020, assim como nenhum estudo científico atualizado foi submetido à apreciação das bancadas para subsidiar a tomada de decisão. Quanto à inexistência do plano de trabalho, tem-se que a União encaminha para as bancadas de trabalhadores e empregadores e para o próprio MPT suas propostas de revisão de NRs menos de uma semana antes da primeira reunião dos GTTs (Grupos de Trabalho Tripartites), o que inviabiliza qualquer exame sério, pois, além da falta de um planejamento dos trabalhos, as propostas vêm desacompanhadas dos pressupostos, dos principais aspectos contemplados nos textos normativos, etapas de trabalho e cronograma. A União alega que o faz “não de maneira centralizada, mas de forma esparsa, permeando os documentos que compõem o processo que encaminha a proposta de regulamentação para publicação”. Por outras palavras, a própria União reconhece que o processo de revisão das NRs em curso é desprovido de AIR e que o plano de trabalho é improvisado em meio ao açodamento do ritmo do processo revisional.

Proteção – O artigo 7º diz que o texto técnico tem que ser apresentado para consulta pública para análise e encaminhamento de sugestões a respeito e que o prazo pode variar de 30 a 120 dias – a ser definido pelo DSST – e inclusive ser prorrogado se o DSST assim avaliar. Isso também não está sendo respeitado na avaliação do MPT?

Leivas – Conforme já elucidado acima, o que é levado à consulta pública não é o texto técnico base, mas a proposta de texto para revisão. Outro aspecto irregular relevante é que, embora sejam matérias de alta relevância, todas as consultas públicas foram disponibilizadas pelo prazo mínimo (30 dias), independentemente da amplitude e da complexidade do tema. É como se houvesse um prazo único tomado o piso temporal normativo. Além do prazo exíguo, as consultas públicas foram abertas simultaneamente para diversas NRs, prejudicando sobremaneira essa etapa do processo em nome de uma agenda normativa açodada e temerária. É fundamental que a participação das partes interessadas mediante consulta pública ocorra na fase inicial de elaboração da normatização, isto é, na fase do texto técnico base. A consulta pública é um dos mecanismos formais para informação e inserção da sociedade no processo regulatório, conferindo-lhe, assim, a legitimidade que assegura a órgão decisor a certeza de que a regulamentação é aceitável e aplicável. É um imperativo de transparência e de qualidade do processo regulatório, em especial, numa sociedade democrática. À obviedade, a consulta pública tem por escopo divulgar a ideia matricial da regulamentação. Contrário senso, colocar em consulta pública o texto para revisão em vez do texto técnico base, valendo-se invariavelmente do prazo mais exíguo possível e abrindo as consultas de forma simultânea para diversas NRs de alta e diversas complexidades, reduz e prejudica o efeito que se pretende atribuir ao mecanismo da consulta pública, blindando o texto normativo da efetiva participação democrática daqueles serão diretamente afetados pela normatização.

Proteção – O artigo 9º menciona que a proposta de regulamentação ou de revisão de NR, acompanhada do plano de implementação e da indicação do prazo para entrada em vigor, com correspondente justificativa, deve ser encaminhada ao DSST, que a encaminhará à CTPP para apreciação. E que o plano deve prever divulgação e realização de eventos sobre o assunto. Também não está sendo feito na visão do MPT?

Leivas – As propostas de revisão de NRs enviadas à CTPP não estão sendo acompanhadas do plano de implementação com instrumentos de divulgação e eventos para esta finalidade, como audiências públicas, seminários, debates, conferências, de que trata o artigo 12º, para ampla participação da sociedade, nem da correspondente justificativa, salvo a justificativa genérica da busca por simplificação, harmonização e desburocratização; nunca por prevenção de acidentes ou redução dos riscos de acidente de trabalho, o qual, nos termos do art. 7º, XXII, da Constituição Federal, deveria ser o foco principal desse processo, por óbvio.

Proteção – Em que situação se encontra a ACP, quais são os próximos passos no andamento do processo?

Leivas – Com a apresentação da contestação pela União, que já ocorreu, abre-se o prazo do MPT para se manifestar sobre a resposta do réu, encerrando-se a fase postulatória do processo. Nesse contexto, a comissão de procuradores do Trabalho do MPT que está acompanhando o caso está avaliando as providências que legislação processual faculta ao autor da ação.

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