
Valdir Lopes
O italiano Giuliano Franco sempre se interessou por doenças relacionadas ao trabalho. Desde seu Trabalho de Conclusão de Curso, desenvolvido ainda na graduação, o médico passou a dedicar-se à temática, com especial atenção voltada à prevenção destas enfermidades. Bernardino Ramazzini, considerado o “pai da Medicina do Trabalho”, tornou-se objeto de seus estudos na década de 1990, quando um evento promovido pela ICOH (International Commission on Occupational Health) o inspirou a falar sobre a obra daquele que foi o precursor da especialidade no mundo. Desde então, continuou a compartilhar informações a respeito de Ramazzini por meio de palestras e diversos artigos.
Foram estes estudos que o trouxeram à 13ª edição do Fórum Presença, promovido pela Anamt (Associação Nacional de Medicina do Trabalho) no final de outubro. Na ocasião, Giuliano concedeu a entrevista a seguir, na qual, além de comentar a importância e as lições deixadas por Ramazzini há 300 anos, o especialista comenta também sobre o ensino da Medicina do Trabalho na Itália. Avalia os principais elementos para a formação de uma cultura de prevenção, e reforça os desafios atuais e futuros para os médicos do Trabalho.
Fale sobre sua atuação profissional e sobre como se inseriu na Medicina Ocupacional.
Desde o início de minha carreira meu foco era em doenças ocupacionais. Logo que me formei na graduação, em 1970, apresentei uma pesquisa sobre este tema como Trabalho de Conclusão de Curso. Em seguida, encontrei aquele que se tornou meu mentor: o professor Salvatore Maugeri. Foi ele quem me inspirou e me inseriu na carreira de Medicina do Trabalho. Logo na sequência, fui professor assistente na Universidade de Pavia, na Itália. Depois, tornei-me professor associado na mesma universidade. Em 1993, mudei-me para a cidade de Modena, quando tornei-me professor titular na Universidade de Modena. Assim, minha primeira especialização foi em clínica médica na área de Medicina Interna. Depois, cursei especialização em Cardiologia. Só então em 1980 voltei-me para Medicina do Trabalho. Mas o contato com esta área sempre esteve presente, desde a graduação e meu trabalho no Instituto de Medicina do Trabalho da Universidade de Pavia ainda nos anos de 1970.
Quais os principais desafios dos médicos do Trabalho atualmente?
É difícil responder a esta questão, pois existe a posição oficial e minha opinião pessoal. Prefiro responder misturando um pouco destas duas visões. Entendo que hoje, de fato, a missão dos médicos do Trabalho é garantir o cumprimento legal, cumprir todos os regulamentos, mas priorizando o mais importante – prevenir doenças e proteger os trabalhadores. Não é algo fácil, é um desafio. Pessoalmente, acredito que, no futuro, isto vai mudar. Nosso principal objetivo será a promoção da saúde. Esta é uma opinião que Ramazzini já dividia conosco três séculos atrás.
O senhor leciona Medicina do Trabalho na Universidade de Modena. Como está o ensino desta especialidade na Itália atualmente?
Ensinar Medicina do Trabalho na Itália é diferente, pois não há um curso só de Medicina do Trabalho. A forma como se dá este ensino depende das universidades. Em algumas instituições, ela é parte da disciplina de Saúde Pública, junto com a Higiene e a Medicina Legal, que, na Itália, também é chamada de Medicina Forense. Em outras universidades, incluindo Modena, a Medicina do Trabalho é parte integrante de outras disciplinas. Por exemplo, nas aulas de Pneumologia, de Hematologia, quando os alunos revisam os tipos de doenças que têm relação com sua especialidade, eles também reveem as doenças ocupacionais, com foco na prevenção. Na Hematologia, por exemplo, uma das enfermidades abordadas na área ocupacional é a leucemia por exposição ao benzeno, e como prevenir este mal. Na Reumatologia, a mesma coisa é feita, considerando as doenças musculoesqueléticas. Então, em todas as disciplinas, existe uma visão ocupacional. Nestes casos, a Medicina do Trabalho é conhecida como Patologia Sistemática sendo lecionada durante três semestres integrada às disciplinas específicas, e é a mais difícil da graduação de Medicina na Itália. Especificamente em minhas aulas, falo a respeito dos fatores de risco advindos da exposição a diversos agentes e, principalmente, da prevenção. O objetivo é preventivo. Assim, caso eu esteja lecionando para uma turma de Hematologia, por exemplo, o hematologista vai falar sobre a doença em si, como se faz o diagnóstico e o tratamento. Eu completarei as informações com uma visão preventiva, associando os fatores de risco àquela determinada doença.
*Entrevista à repórter Priscilla Nery com a colaboração da médica do Trabalho Márcia Bandini
Confira a entrevista completa na edição de janeiro da Revista Proteção.