
Legislação trabalhista publicada em 2005 mudou a realidade dos trabalhadores rurais
Há cerca de 35 anos, precisamente no dia 15 de maio de 1984, os cortadores de cana, chamados de “boias-frias”, que atuavam na região de Guariba, interior do Estado de São Paulo, realizaram uma greve considerada histórica, reivindicando melhorias nas condições de trabalho.
Só mesmo com a escravidão poderia se comparar a forma como estas pessoas exerciam a sua atividade no corte e colheita de cana no Brasil, especialmente em São Paulo. A grande maioria eram migrantes vindos do Nordeste e de regiões mais pobres de Minas Gerais, como o Vale do Jequitinhonha. Eram arregimentados por intermediários dos fazendeiros denominados “gatos”, que os contratavam e os transportavam, muitas vezes em caminhões e, depois, ficavam acomodados em alojamentos improvisados. Alguns destes lugares eram antigos estábulos e tinham como único objetivo alojar os trabalhadores na época de safra.
Estes operários rurais não eram registrados, não recebiam Equipamentos de Proteção Individual, muito menos roupas apropriadas, nem mesmo a alimentação. O termo `boia-fria’ foi cunhado porque estes indivíduos levavam em pequenas marmitas a comida preparada no dia anterior ou na madrugada e a comiam no próprio local onde estavam em um pequeno intervalo da colheita.
As cinzas da palha da cana, queimada para aumentar a produtividade da colheita, exigiam que parte do rosto ficasse coberto como forma de minimizar os problemas respiratórios por ela provocados. Os trabalhadores do campo e os moradores das cidades próximas eram obrigados a conviver com uma enorme poluição atmosférica causada pelas queimadas, conforme atestaram vários estudos feitos por pesquisadores da USP de Ribeirão Preto. Oportuno lembrar que estas coisas ocorriam em pleno século 20.
NORMATIZAÇÃO
O Capítulo V da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), através da Portaria nº 3214, de 1978, editou as Normas Regulamentadoras, entre elas aquelas que visavam atender particularidades do meio rural (NRRs). Mais tarde, a partir de 3 de março de 2005, foi publicada a Portaria nº 86, denominada Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho, Agricultura, Pecuária, Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura – NR 31, concebida a partir da formação de uma comissão permanente com representação do Ministério do Trabalho, Confederação Nacional da Agricultura e representações dos empregados. Vale ressaltar que a Constituição Federal de 1988 igualou os direitos sociais e trabalhistas dos trabalhadores urbanos e rurais.
A partir da NR 31, coube ao empregador rural garantir adequadas condições de trabalho, higiene e conforto aos trabalhadores. Também assegurar proteção contra os riscos decorrentes da atividade agrícola, inclusive aqueles relacionados à adoção de novas tecnologias e permitir que o representante dos trabalhadores, legalmente constituído, acompanhasse a fiscalização dos preceitos legais e regulamentares sobre SST.
Do movimento dos trabalhadores rurais em Guariba, em maio de 1985, à adoção da NR 31 em março de 2005, se passaram 20 anos. Nesse meio tempo, juntamente com a edição da Constituição Federal de 1988, pródiga na preservação dos Direitos Humanos, houve a possibilidade de paz no campo e a preservação de vidas. Mais uma vitória da Saúde e Segurança no Trabalho.