
Tragédia que ocorreu há 34 anos ainda hoje leva pessoas à morte
Três de dezembro de 1984. Um vento refrescante da meia noite soprava na cidade de Bhopal, na região central da Índia. A torre mais alta da fábrica de agrotóxicos da empresa Union Carbide emanava uma fina nuvem de vapor. Levada pelo vento, a fumaça se transformou em neblina que tomou a cidade em pouco tempo.
Naquele momento apocalíptico, ninguém tinha a menor ideia do que ocorria. As pessoas simplesmente começaram a perder a vida da maneira mais horripilante possível. Alguns vomitavam de forma incontrolável, entravam em convulsão e caiam mortas. Outras foram esmagadas pela correria nas ruas estreitas, onde se via apenas uma luz marrom das lâmpadas em meio à névoa que cobria a cidade. “Era como se alguém tivesse enchido nossos corpos com pimenta malagueta”, declarou um sobrevivente.
Cerca de três mil pessoas morreram na hora. Nas semanas e meses subsequentes, calcula-se que mais 15 mil também perderam a vida em consequência do vazamento do isocianato de metila. Em torno de 300 mil sofreram algum tipo de intoxicação. Ainda hoje duas a três pessoas, semanalmente, vão a óbito por causa do acidente.
CONTAMINAÇÃO
Segundo a Anistia Internacional, com sede em Londres, cerca de 350 mil quilos de lixo tóxico permanecem onde se localizava a empresa. Em 2012, 28 anos após a tragédia, o CSE (Centro para a Ciência e Meio Ambiente), realizou uma avaliação independente e encontrou alto grau de contaminação do solo e da água subterrânea ao redor da fábrica. Desde 2013, este mesmo organismo vem colaborando juntamente com especialistas de vários países para que se dê andamento a um plano de ação visando a recuperação do meio ambiente na área afetada. Passados cinco anos, percebe-se que pouco se avançou na matéria.
“Mesmo não tendo visto outra tragédia humana como a daquela noite, o país continua tendo diversos acidentes industriais que deixam mortos e vertem uma enorme quantidade de dejetos perigosos”, alertou Sunita Naraim, diretora-geral do CSE, na apresentação de um livro que escreveu sobre o assunto.
Segundo o professor do Departamento de Geologia da Universidade de Nova Délhi, Shashank Shekar, as indústrias químicas, esquecendo ou ignorando os tristes acontecimentos do passado, pouco fazem para conter vazamentos que, aliás, seguem sendo a maior causa de contaminação hídrica na Índia. Milhares de pessoas adoecem anualmente por exposição a metais pesados.
A empresa causadora do acidente foi intimada a reparar aqueles que, com o desastre, perderam sua capacidade de trabalhar. Depois de 10 anos de disputa legal, o governo indiano e a companhia chegaram a um acordo, fixando a indenização no irrisório montante de 470 milhões de dólares. Essa quantia deveria ser capaz de pôr fim a toda responsabilidade da indústria perante a sociedade. O valor médio, de 370 a 533 dólares por pessoa foi suficiente apenas para cobrir despesas médicas por cinco anos. Muitas das vítimas, assim como seus filhos, irão sofrer os efeitos do desastre pelo resto de suas vidas. Quem cuidará disso?
O acidente de Bhopal motivou a OIT (Organização Internacional do Trabalho) a buscar uma regulação do tema e editar novas convenções internacionais. Todavia, os especialistas têm certeza de que a lição não foi totalmente assimilada. A suspeita é de que muitos trabalhadores e populações menos favorecidas mundo afora estejam sujeitas a tragédias de igual proporção. Tomara que nunca mais aconteça!
*Coluna publicada na edição 323, novembro de 2018.
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Luis Augusto de Bruin – Especialista em Direito Trabalhista e |